O
serviço “Uber” tem enfrentado sucessivas barreiras, legais e humanas, no acesso
ao mercado: por um lado, sucessivas proibições decretadas em Espanha, Alemanha,
França e Portugal e, por outro, protestos de taxistas em Paris que incluíram,
designadamente, agressões a motoristas afetos ao serviço “Uber”. É um tema que
está, inevitavelmente e porventura não pelas melhores razões, na ordem do dia e
que poderá ter desenvolvimentos supranacionais nos próximos meses.
Deixemos
de lado as relevantes questões da obrigatoriedade licenciamento – por exemplo,
ao abrigo do regime de serviço público de transportes de passageiros flexível –
e da concorrência desleal, bem como uma apreciação sobre a segurança, conforto
e eficiência destes serviços de transporte de passageiros, a qual poderá ser
feita, com maior sucesso, por cada utilizador de ambos os serviços.
Vamos
procurar dar algumas pistas de solução à seguinte questão: a atividade de
motorista (em regime “Uber” ou táxi) pode ser prestada licitamente ao abrigo de
um contrato de prestação de serviços?
Sem
pretensões iniquamente expansionistas (senão mesmo hiperbolizantes), o Direito
do trabalho deve guiar o exame das circunstâncias do caso concreto para
dilucidar fugas ilegítimas para outros ramos do Direito, nomeadamente através
de contratos de estágio ou de diferentes modalidades de contratos de prestação
de serviços.
Vejamos
sumariamente algumas decisões.
Num
primeiro caso, foi considerado que não basta a cessação do contrato por via da
aplicação da sanção disciplinar de despedimento com justa causa para conduzir à
qualificação do contrato de trabalho, quando o motorista desenvolvia a sua
atividade com autonomia, suportava os custos de manutenção da viatura e podia
ceder a utilização do táxi a outros motoristas (Ac. TRP de 7.4.2014 (Maria JoséCosta Pinto)).
Num
segundo caso, o pagamento de uma remuneração mensal e a existência de um acordo
de isenção de horário de trabalho que não originou o pagamento de qualquer remuneração
adicional não são suficientes para “laboralizar” a relação contratual existente
entre as partes, quando não seja possível determinar o grau de subordinação do
motorista ao beneficiário da atividade (Ac. TRL de 12.1.2011 (AlbertinaPereira)).
Recentemente,
no outro lado do Atlântico, a “California Labor Commission” declarou a
existência de um contrato de trabalho entre a “Uber” e uma motorista, visto que
a empresa estava envolvida em todos os aspetos fundamentais do transporte de
passageiros, nomeadamente: (i) escolha e seleção dos motoristas; (ii) indicação
dos clientes; (iii) controlo sobre o tipo de viatura que pode ser utilizada
pelo motorista; (iv) gestão de um sistema de avaliação pelo utilizador do
serviço; (v) fixação do preço a cobrar ao utilizador e da comissão a pagar ao
motorista; (vi) proibição das gorjetas; (vii) fornecimento do smartphone necessário para aceder à
aplicação; e (viii) ausência de influência do motorista na determinação da
rentabilidade do negócio.
É
certo que esta decisão – a manter-se – pode influenciar decisivamente o
transporte de passageiros desenvolvido pela “Uber” à escala mundial. Todavia,
não influenciará igualmente o transporte de passageiros em táxi, nomeadamente
nos casos em que o táxi pertence ao beneficiário da atividade, o qual paga uma
remuneração fixa ou à percentagem ao motorista e determina o aproveitamento
sucessivo do táxi por diferentes motoristas em regime de escala?
Nota: publicado na Revista Advocatus, n.º 64, Julho de 2015
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