A confiança é o elo de ligação que mantém vivas as relações pessoais e, necessariamente, as relações profissionais. Não surpreende, portanto, a sua importância no campo do Direito do trabalho, nomeadamente em sede de despedimento com justa causa.
Devemos ter presente que as infrações disciplinares podem dar lugar à aplicação de alguma das seguintes sanções: (i) repreensão; (ii) repreensão registada; (iii) sanção pecuniária; (iv) perda de dias de férias; (v) suspensão do trabalho com perda de retribuição e de antiguidade; (vi) despedimento sem indemnização ou compensação. Contudo, a escolha da sanção pelo empregador deve ser proporcional à gravidade da infração e à culpabilidade do infrator.
De referir que a gravidade da infração ou a culpabilidade do infrator não estão diretamente relacionadas com a existência de prejuízo e, muito menos, com o valor do prejuízo. Com efeito, recordemo-nos do caso do despedimento do fiel de armazém que guardou materiais, de valor diminuto, do empregador no seu armário pessoal (Ac. STJ 10.7.1996 (Almeida Deveza)).
No início de 2015, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) foi chamado a apreciar a regularidade do despedimento com justa causa de um trabalhador que participa a ocorrência de um acidente de trabalho, tendo sido apurado que as lesões declaradas não ocorreram de acordo com o circunstancialismo invocado pelo trabalhador, isto é, as lesões não foram provocadas pelo impacto das portas automáticas existentes no local de trabalho.
O STJ considerou que a prestação de falsas declarações viola o dever de lealdade para com a empregadora pois, com intuito fraudulento, o trabalhador invoca eventos que consabidamente não correspondem à realidade. Esta conduta foi tida como particularmente grave e censurável e, por isso, suscetível de colocar em crise a confiança em que se alicerçava a relação de trabalho. O Tribunal entendeu, ainda, que a ausência de antecedentes disciplinares em 12 anos de trabalho e a inexistência de prejuízos graves para o empregador abonavam a favor do trabalhador, mas não neutralizavam a gravidade do comportamento sendo, por isso, o despedimento lícito (Ac. STJ de 14.1.2015 (Pinto Hespanhol)).
Num outro caso, o Tribunal da Relação de Coimbra (TRC) considerou o seguinte caso como violação do dever de lealdade suscetível de quebrar a relação de confiança e, como tal, de consubstanciar um despedimento com justa causa: o trabalhador falta ao serviço e apresenta um atestado de doença; nesse período presta a sua atividade noutra entidade; tendo estes factos ocorrido depois de o empregador ter recusado um pedido de dispensa do trabalhador para prestar serviços a outrem (Ac. TRC de 22.10.2009 (Fernandes da Silva)).
Nota 1: publicado no Jornal OJE no dia 10.2.2015.
Nota 2: em coautoria com Inês Garcia Beato.
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