Este blog (sobre)viverá da aplicação do Direito ao caso concreto...

26 de abril de 2013

Haverá um Direito do trabalho bancário?

A jurisprudência laboral relativa ao sector bancário é vasta e rica e permite identificar determinados comportamentos tipicamente ilícitos que concretizam o conceito de justa causa de despedimento nas áreas financeiras. 
Ao nível organizativo, as instituições de crédito têm estruturas ou secções para fiscalizar o escrupuloso cumprimento das obrigações legais, regulamentares e éticas dos seus trabalhadores que, no entanto, não têm competência disciplinar. Nesse sentido, parece existir, no empregador, uma dissociação interna entre o poder de fiscalização e o poder disciplinar
Vejamos alguns casos jurisprudenciais recentes:

STJ 5.3.2013 (Pinto Hespanhol)
Em resposta à questão colocada aquio prazo de caducidade da acção disciplinar tem apenas por referência o empregador (no caso, o conselho de administração) ou o superior hierárquico com competência disciplinar. Na falta de delegação de competências, será irrelevante o conhecimento dos ilícitos por parte da Direcção de Recursos Humanos ou da Direcção de Auditoria Interna.
O STJ considerou, neste caso, que a violação do dever de atribuir funções correspondentes à actividade contratada (gerente de balcão), durante cerca de 2 anos, constitui o empregador no dever de indemnizar por danos não patrimoniais. No caso, o empregador foi condenado a pagar uma indemnização no montante de € 10.000,00.

STJ 8.1.2013 (Fernandes da Silva)
No plano de valoração desta norma, não pode descurar-se o sector de actividade (bancária) em que se desenvolve a prestação contratada e a particular exigência da componente fiduciária nela pressuposta, domínio em que a “confiança”, mais que mero “suporte psicológico” de uma relação jurídica inter-pessoal duradoura, se traduz afinal no exercício de uma “função de confiança”, essencial na organização técnico-laboral criada e mantida pelo empregador.
Exige-se dos trabalhadores bancários uma postura de inequívoca transparência, insuspeita lealdade de cooperação, idoneidade e boa fé na execução das suas funções, respeitando escrupulosamente as regras do contrato (as decorrentes da Lei geral e, particularmente, as constantes das normas internas que disciplinam a sua intervenção profissional).
É de afirmar a justa causa do despedimento, atenta a lesão da imagem pública de confiança e segurança da instituição bancária, decorrente da violação do dever de lealdade, quando está demonstrado que a A., à revelia das regras que conhecia perfeitamente por força do exercício das suas funções, pediu, repetidamente, empréstimos a clientes da sua empregadora, para fazer face a despesas pessoais e/ou de empresas familiares, não sendo de relevar, na concretização do juízo subsumível à noção de justa causa, as garantias e pontualidade na satisfação, por parte da A., dos respectivos compromissos assumidos com esses clientes da R.

STJ 21.11.2012 (Fernandes da Silva)
O trabalhador bancário que, repetidamente, aprova limites de crédito a descoberto, em contas abertas sem cumprimento dos requisitos exigidos pelas Instruções de Serviço, não fiscaliza essas contas e autoriza pagamentos a descoberto sem que detenha poderes creditícios para o efeito, viola os deveres de obediência, zelo e lealdade, violação essa que, pela sua gravidade, justifica o cominado despedimento.

STJ 31.10.2012 (António Leones Dantas)
O trabalhador está abrangido pelo sigilo bancário e, por isso, não pode juntar a um processo judicial documentos que estejam na sua posse, sob pena de violação do dever de segredo (ilícito disciplinar). A referida junção constitui uma quebra do referido dever de segredo ou sigilo, visto que permite o acesso a informação protegida, pelo menos, por parte do Tribunal, de todos os profissionais envolvidos na acção e das demais pessoas que possam aceder de forma legítima aos autos. A utilização destes documentos em juízo só poderia verificar-se após cumprimento dos procedimentos necessários ao levantamento do dever de segredo. 

STJ 12.9.2012 (António Leones Dantas)
Viola grave e culposamente os deveres de obediência e de lealdade, consagrados nas alíneas e) e f), do n.º1 e no n.º 2 do artigo 128.º, do mesmo Código do Trabalho, o trabalhador responsável pela gestão de agência bancária que, para fazer face a descobertos, altera os limites de crédito que lhe estão atribuídos em contas de que é titular naquela agência, visando impedir dessa forma que os mesmos descobertos fossem detectados pelos mecanismos de controlo interno da instituição;
A conduta do trabalhador descrita nos números anteriores quebra de forma irreparável a relação de confiança entre as partes que é essencial à relação de trabalho no âmbito de instituições bancárias, tornando inexigível a sua manutenção e integra, por tal motivo, justa causa de despedimento.

STJ 5.7.2012 (Pinto Hespanhol)
Provando-se que o trabalhador, que exercia as funções de director de balcão, com o desrespeito pelos mais elementares deveres de cautela da actividade bancária e sem garantias sólidas, aprovou créditos de valor considerável, permitiu saldos devedores por montantes e períodos superiores ao regulamentado e desobedeceu, conscientemente, a normas atinentes à concessão de crédito, violou, culposamente e de forma grave, os deveres de realizar com zelo e diligência as funções que lhe estavam confiadas, de cumprir as ordens e instruções do empregador respeitantes à execução do trabalho e de guardar lealdade ao empregador, previstos no artigo 128.º, n.º 1, alíneas c), e) e f) do Código do Trabalho de 2009.
Neste contexto, o trabalhador, com o seu comportamento grave e culposo, pôs em crise a permanência da confiança em que se alicerçava a relação de trabalho e que, insubsistindo, torna imediata e praticamente impossível a respectiva manutenção, que não é razoável exigir à empregadora, verificando-se, assim, justa causa para o despedimento, nos termos do artigo 351.º, n.º 1, do Código do Trabalho de 2009.


STJ 23.11.2011 (Fernandes da Silva)
É de afirmar a justa causa do despedimento, atenta a quebra da relação de confiança, quando está demonstrado que o A., à revelia das regras que conhecia perfeitamente por força do exercício das suas funções, alterou, sucessivamente, os plafonds dos cartões de crédito que lhe estavam afectos, sem a devida autorização hierárquica, com movimentações cruzadas entre duas contas bancárias de que era titular, em inobservância das correspondentes normas procedimentais de controlo instituídas pela R., consubstanciando-se, assim, uma conduta fora da imperativa transparência exigível no comportamento do trabalhador bancário, não sendo de relevar, na concretização do juízo subsumível à noção de justa causa, os montantes dos valores monetários em causa, a reposição dos eventuais prejuízos, ou mesmo a sua inverificação real.

STJ 23.11.2011 (Pinto Hespanhol)
O apurado comportamento da autora — apropriação de valores entregues pelos clientes da ré para depósito nas respectivas contas bancárias para afectar ao seu proveito pessoal e a execução de operações de liquidação, anulação e/ou lançamento de montantes nas aludidas contas bancárias em desconformidade com as determinações dos respectivos titulares, de forma a obter para si os montantes nessas operações reportados e manipular registos informáticos correspondentes a esses movimentos — violou, grave e culposamente, o dever de lealdade previsto na alínea e) do n.º 1 do artigo 121.º do Código do Trabalho de 2003.
Com efeito, exige-se dos trabalhadores bancários que assumam uma postura de inequívoca transparência e que exerçam as suas funções de forma idónea, leal e de plena boa fé, com respeito pelas disposições legais e pelas normas emanadas dos respectivos Conselhos de Administração, de forma a preservar a imagem dos bancos empregadores enquanto instituições, pelo que a autora, com o seu comportamento grave e culposo, pôs em crise a permanência da confiança em que se alicerçava a relação de trabalho e que, insubsistindo, torna imediata e praticamente impossível a sua manutenção, verificando-se, assim, justa causa para o despedimento.

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