No âmbito do Direito de Autor, consideram-se obras as criações intelectuais do domínio literário, científico e artístico, por qualquer modo exteriorizadas (art. 1.º, n.º1, CDADC). Este ramo do Direito não protege, por si só e enquanto tais, as ideias, os processos, os sistemas, os métodos operacionais, os conceitos, os princípios ou as descobertas (art. 1.º, n.º2, CDADC). De referir ainda, que a protecção da obra é independente da sua divulgação, publicação, utilização ou exploração (art. 1.º, n.º3, CDADC).
O CDADC contém uma lista exemplificativa de obras protegidas, na qual constam os projectos, esboços e obras plásticas respeitantes à arquitectura, ao urbanismo, à geografia ou às outras ciências (art. 2.º, n.º1, al. l), CDADC).
O CDADC atribui a autoria da obra de arquitectura, de urbanismo ou de design ao criado da sua concepção global e respectivo projecto (art. 25.º CDADC). Todavia, no caso de obra colectiva, o direito de autor é atribuído à entidade singular ou colectiva que tiver organizado e dirigido a sua criação e em nome de quem tiver sido divulgada ou publicada (art. 19.º, n.º1, CDADC). Assim, importa ter presente os seguintes Acórdãos:
a) Ac. TRL 17.2.2005 (Olindo Geraldes): As obras de arquitectura criadas por uma pluralidade de
pessoas, organizadas por iniciativa de certo atelier (empresa) e divulgadas em seu nome,
correspondem as obras colectivas, pertencendo o direito de autor ao dono do
atelier.
b) Ac. STJ 11.10.2005 (Nuno Cameira): Provando-se que o Autor, um conhecido
arquitecto, teve participação preponderante na concepção global e no processo de
criação dos projectos de arquitectura de determinadas obras concebidas entre
1965 e 1972, período de tempo em que trabalhou na equipa do atelier do
arquitecto ao qual é atribuída pelos Réus, na revista que dirigem e editam, a
respectiva paternidade, deverá considerar-se que tais obras de arquitectura
correspondem a obras colectivas.
No que toca às formas de utilização, diz o art. 68.º, n.º2, al. l) CDADC:
Assiste ao autor, entre outros, o direito exclusivo de fazer ou autorizar, por si ou pelos seus representantes (...) a construção de obra de arquitectura segundo o projecto, quer haja ou não repetições.
Neste Ac. TRP 31.1.2012 (José Carvalho) foi decidido o seguinte:
I - Alegava o Autor que era “titular dos direitos de autor incidentes sobre a obra
em que consiste a sua ideia de traçado, inserção urbana e de projecto da Linha
de Metro Porto/Campanha – Gondomar/S. Cosme.”
II
- Provou-se que a passagem da linha de metro pelo viaduto resultou de uma ideia
do Autor. O mesmo se diga do traçado Antas/Gondomar, servindo as populosas
localidades de Fânzeres e Rio Tinto (nº 26 a 39 dos factos).
III - Mas, em ambos os casos essa utilização apenas ocorreu após a
elaboração de um conjunto de estudos, efectuados por entidades especializadas
(nº 46 a 52 dos factos). Os projectos que serviram de base à execução das
mencionadas obras apoiaram-se naqueles estudos. Não se serviram, de imediato,
das ideias do Autor.
IV - Em apoio da sua posição,
o recorrente alude à alínea l) do nº 2 do artigo 68º. Segundo esta norma,
assiste ao autor, entre outros, o direito exclusivo de fazer ou autorizar, por
si ou pelos seus representantes, a construção de obra de arquitectura segundo o
projecto. No caso inexistiu projecto do Autor, o que não permite a aplicação
daquela norma.
Sobre o mesmo litígio, decidiu o STJ (Ac. STJ 5.7.2012 (Gabriel Catarino)):
I - Para que uma obra possa ser protegida
pelo direito autoral, é imprescindível que ela assuma e se expresse com um traço
distintivo e diferenciador de outras obras que já tenham adquirido o poder de
ser conhecidas pelo comum das pessoas.
II - É fundamental que a obra se projecte e cobre
comunicação, no sentido de que o resultado do acto ou da acção criadora possa
ser adquirido e percepcionado pelo comum das pessoas.
III - A dicotomia ideia-expressão surge como antinomia do
que deve ser entendido como protegível pelo direito de autor e aquilo que não o
deverá ser. As ideias, por mais originais e novas que possam ser, nunca poderão
ser tuteladas ou protegidas pelo direito de autor enquanto não obtiverem
expressão que as torne e projecte na perceptibilidade intelectiva do ser
humano.
IV - O CDADC protege
as criações intelectuais expressas em obras de arquitectura e urbanismo – arts.
1.º, n.º 1, e 2.º, n.º 1, al. l). Já o art. 25.º considera autor de obra de
arquitectura, de urbanismo e de design, o criador da sua concepção global e
respectivo projecto, sendo que a al. j) do art. 68.º estipula que assiste ao
autor o direito exclusivo de fazer ou autorizar “a construção de obra de
arquitectura segundo o projecto quer haja ou não
repetições”.
V - A
exteriorização da ideia apresentada pelo autor, para o traçado da linha do metro
a consignar na projectada ligação Campanhã-Gondomar com passagem pelo antigo
estádio das Antas, não colhe suficiente expressividade para se alçapremar à
categoria de projecto ou fase de projecto criador de uma solução diferenciada,
distinta de outras ideias que pudessem estar em estudo para o traçado do metro
nessa ligação, se os documentos, alguns elaborados sobre elementos cedidos por
outras entidades, evidenciam expressões formais incipientes e insusceptíveis de
ser qualificados como projectos de arquitectura, isto é, incapazes e inaptos
para que deles se pudesse extrair a existência de um rasgo conceptivo e
imaginativo revelador de originalidade que elevasse a ideia à categoria de
obra.
VI - Se os esquissos e
bosquejos que constituem o suporte da ideia que o autor conclama como traduzindo
uma assumpção criadora, não reverberam uma concepção, projecto ou ideia
criadora, fruto de um processo reflexivo e técnico, ainda que com auxilio e
servindo-se de suportes preexistentes, mas tão só um trabalho mecânico,
projectado num ensaio possível a qualquer um que estivesse colocado na posição
do autor, habilitado com os mesmos meios e com acesso a idênticos elementos,
cumpre concluir que, ainda que tivesse tido algumas ideias para a solução a
conferir ao traçado do metro na ligação Porto-Gondomar, o autor não as expressou
com suficiente individualidade para que lhe possa ser atribuída a autoria da
solução técnica encontrada.
O autor do projecto tem o direito de fiscalizar a sua construção ou execução em todas as fases e pormenores, de maneira a assegurar a exacta conformidade da obra com o projecto de que é autor. Todavia, após a edificação segundo o projecto, a obra pode ser alterada sem consentimento prévio do seu autor, tendo este direito a ser indemnizado por perdas e danos e a repudiar a paternidade da obra modificada (art. 60.º, n.ºs 1 a 3, CDADC).
Sobre estas questões, vide Ac. STA 2.12.2003 (António Madureira):
I - É ilícita a modificação de um projecto de arquitectura de uma obra, sem consentimento do autor do projecto original, determinando o dever de indemnizar esse autor a execução dessa obra de acordo com o projecto modificado sem o seu consentimento (...).
II - Essa execução indevida não implica o dever de indemnizar por dano invocado a título de lucros cessantes, atribuído ao não recebimento dos honorários que seriam pagos pela elaboração dessa modificação, pois que o dono da obra não estava obrigado a adjudicar essa modificação ao Autor do projecto original, podendo até abrir um novo concurso para a elaboração de um novo projecto, pelo que, não tendo esse autor um direito subjectivo à adjudicação da elaboração das modificações, inexiste nexo de causalidade entre o alegado acto ilícito e o não recebimento dos honorários por um trabalho que não chegou a realizar, sendo certo que lhe foi pago o trabalho efectivamente executado.
III - Tendo-se, contudo, provado que, a reconhecer-se que a obra executada se tratava de uma ampliação do projecto de arquitectura dos autores, levaria a que os autores beneficiassem na sua vida profissional do respeito e publicitação do seu trabalho inerente a tal obra, com reconhecimento nos seus currículos, haveria lugar a indemnização por danos morais, danos esses que são os danos indemnizáveis consagrados no n.º 2 do referido artigo 60.º do CADC.
Sobre este tema, pode ser ainda consultada aqui a nota disponibilizada pela Ordem dos Engenheiros e os seguintes Acórdãos: Ac. TRE 10.7.2007 (António João Latas) sobre a protecção penal e Ac. STJ 6.5.2003 (Armando Lourenço) sobre o contrato de projecto de arquitectura.
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