Este blog (sobre)viverá da aplicação do Direito ao caso concreto...

4 de março de 2014

Os riscos laborais das redes sociais

As diversas redes sociais - como o Facebook, o Linkedin e o Twitter - fazem parte do nosso quotidiano, estando presentes no telemóvel, no computador pessoal, no tablet e, não raras vezes, no local de trabalho. As redes sociais proporcionam uma nova relação de vizinhança.

Estamos mais próximos de amigos e conhecidos, independentemente da localização e da profissão de cada um. Podemos difundir, rapidamente e para um número (quase) indeterminável de pessoas, as nossas opiniões e pontos de vista, bem como divulgar trabalhos, interesses sociais, culturais e políticos.

Por seu lado, as empresas utilizam as redes sociais como meios privilegiados de divulgação de produtos e serviços e de consolidação da sua marca. Sem prejuízo de uma desmaterialização crescente do curriculum vitae, o recurso à informação disponível no espaço virtual tem assumido uma importância crescente nos processos de recrutamento como forma de verificar ou complementar a informação prestada pelo candidato a emprego.

Paralelamente, vão surgindo cada vez mais notícias de despedimentos, em Portugal e no estrangeiro, com fundamento em declarações veiculadas nas redes sociais dos trabalhadores ou na criação de páginas nas redes sociais como nova forma de luta laboral.

Pode, inclusivamente, colocar-se a questão da admissibilidade do controlo do uso das redes sociais no local de trabalho através dos meios informáticos disponibilizados pelo empregador.

São, portanto, múltiplas as questões que se podem levantar.

Do lado do trabalhador podemos identificar as seguintes linhas de reflexão:

Em primeiro lugar, a utilização das redes sociais no local de trabalho e durante o horário de trabalho é invariavelmente um foco de distração e, nesse sentido, pode constituir uma violação do dever de realizar o trabalho com zelo e diligência.

Em segundo lugar, caso o empregador tenha definido regras sobre a utilização dos instrumentos de trabalho informáticos, navegar nas redes sociais pode constituir, igualmente, uma violação do dever de cumprir as ordens e instruções do empregador. Em terceiro lugar, a divulgação de informações relativas à organização, aos serviços e aos produtos da empresa através das redes sociais poderá constituir a violação de deveres de confidencialidade e sigilo.

Em quarto lugar, a criação de páginas ou grupos virtuais ou a colocação de posts nas páginas pessoais destas redes sociais com mensagens difamatórias da empresa ou de colegas ou para a divulgação de informações confidenciais ou privadas do empregador ou de colegas constituem, igualmente, violação dos deveres laborais dos trabalhadores.

Em qualquer destes casos e em função das circunstâncias do caso concreto, o empregador poderá instaurar um procedimento disciplinar para aplicar uma sanção conservatória do vínculo laboral (por exemplo uma suspensão com perda de retribuição) ou, inclusivamente, para aplicar o despedimento-sanção.

Do lado do empregador podemos apontar alguns aspetos dignos de ponderação.

O empregador não pode, em regra, exigir a candidato a emprego ou a trabalhador que preste informações relativas à sua vida privada, à sua saúde ou estado de gravidez. Todavia, não lhe está vedado o recurso à informação disponível na web, nomeadamente se tiver tido origem no próprio trabalhador. Um post irrestrito do trabalhador pode comportar, deste modo, o seu consentimento para a divulgação pública de dados pessoais.

Devemos ter presente que o trabalhador - tal como o empregador - tem direito à privacidade no contexto laboral, isto é, à reserva e confidencialidade das mensagens de natureza pessoal e ao acesso a informação de carácter não profissional que envie, receba ou consulte. Por isso, o acesso a este tipo de informação privada não pode ter reflexos na relação laboral (por exemplo, fundamentar um despedimento com justa causa disciplinar) e constitui ilícito civil e criminal.

Em suma, os trabalhadores não devem olhar para as redes sociais como espaços de irresponsabilidade e de arbítrio, mas aos empregadores será cada vez mais exigível a definição de regras e procedimentos aplicáveis à utilização das redes sociais no contexto laboral.


Nota: artigo publicado no Jornal Oje de 25.02.14.

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